Só Couto e Gervásio votam contra projeto que dificulta aborto legal em meninas estupradas

Sete deputados federais da Paraíba votaram contra o projeto que torna ainda mais difícil o acesso de menores de 14 anos vítimas de violência sexual e grávidas a serviços de aborto permitidos por lei. A votação foi por 317 votos a 111 e aconteceu ontem à noite. Votaram a favor do projeto de decreto legislativo (PDL) Aguinaldo Ribeiro (PP), Cabo Gilberto (PL), Damião Feliciano (União), Mersinho Lucena (PP), Romero Rodrigues (Podemos), Wellington Roberto (PL) e
Wilson Santiago (Republicanos). Os deputados Gervásio Maia (PSB) e Luiz Couto (PT) foram contrários à proposta. Estiveram ausentes Murilo Galdino (Republicanos) e Ruy Carneiro (Podemos). Hugo Motta (Republicanos) não votou porque presidia a sessão.

A decisão anula uma resolução do Conanda, publicada em dezembro de 2024, que estabelecia orientações para o atendimento de crianças e adolescentes em situações de aborto previsto em lei. O documento tratava de pontos como a garantia de prioridade no acesso ao procedimento, preservação de sigilo e oferta de cuidado seguro e humanizado.

No Brasil, o aborto é tipificado como crime desde 1940, mas a própria legislação prevê exceções: quando a gravidez resulta de estupro ou quando há risco de morte para a gestante. Em 2012, o STF ampliou essas situações ao reconhecer a possibilidade de interrupção da gestação em casos de fetos anencéfalos.

Apesar disso, na prática, o acesso a esse direito tem sido cada vez mais dificultado no Brasil. Pela lei, qualquer relação sexual com menor de 14 anos é estupro de vulnerável, e estão nessa faixa de idade as maiores vítimas de violência sexual. Em 2023, quase 14 mil meninas nessa faixa etária tiveram filhos no país, mas apenas 154 tiveram acesso ao aborto legal.

O texto aprovado por três quartos dos deputados federais, de partidos de direita e do chamado centrão, chama o direito ao aborto previsto por lei de “deturpação ideológica” e afirma que o Conanda “cria tipos penais e extrapola seu poder de regulamentar”.

O texto precisa ainda ser apreciado pelo Senado. Se aprovado, entraria em vigor sem a necessidade de sanção presidencial.

Reação contrária – A campanha Criança Não é Mãe publicou uma nota que classifica a decisão como “constrangedora, desumana e politicamente obscena”. Na nota, a campanha observa que a Resolução 258/2024 não cria novos direitos, mas apenas organiza o acesso ao aborto legal, previsto desde 1940 no Código Penal, e orienta profissionais de saúde, escolas e conselhos tutelares a garantir acolhimento e sigilo. Portanto, com a aprovação do PDL 3/2025, a Câmara desautoriza uma norma de proteção e expõe meninas engravidadas por estupradores à revitimização e à tortura institucional.

“É execrável ter um Parlamento que afirma defender a infância fingindo não saber o que significa obrigar uma criança a seguir com a gravidez decorrente de um estupro”, diz a nota. “Fazem isso fechando os olhos para o fato de que gravidez na infância é sempre consequência de violência e forçar sua continuidade é tortura.”

A campanha destaca que a votação foi marcada por desinformação deliberada e violência política de gênero, com parlamentares homens interrompendo e hostilizando deputadas que tentavam defender o direito das meninas à proteção e à dignidade. O texto denuncia ainda o uso do plenário para espalhar fake news, como a falsa ideia de que a Resolução “legalizaria o aborto até nove meses”.

Segundo a nota, “foi uma escolha política: desinformar para justificar o retrocesso”. E o resultado é devastador: “Desestrutura as redes de proteção, confunde profissionais, fragiliza protocolos de atendimento e expõe meninas violentadas ao abandono e ao silêncio.”

Misoginia, horror e normalização da violência

Para lideranças das organizações da campanha, o que se viu na Câmara foi um espetáculo misógino que transforma a dor de meninas em palanque eleitoral. “O Congresso decidiu dar um recado: o corpo das meninas pode ser usado como território de disputa moral”, afirma Laura Molinari, codiretora da campanha Nem Presa Nem Morta.

Para ela, o PDL “incentiva a normalização da violência sexual infantil” e “premia a impunidade”.

“O Brasil tem um Congresso que escolhe manter tudo como está: meninas sendo estupradas, engravidadas, silenciadas e agora também abandonadas”, completa Laura.

Gabi Juns, diretora do Instituto Lamparina, aponta que o desafio agora é mobilizar o Senado e pressionar o governo a reagir com firmeza.

“O que vimos foi um parlamento que mente, distorce e manipula para punir as vítimas. É hora de transformar indignação em ação. O Senado precisa barrar esse retrocesso.”

A repercussão do caso provocou forte reação de artistas, influenciadoras e ativistas.

A atriz Luana Piovani e a cantora Anitta publicaram vídeos em apoio à campanha, que já conta com milhares de compartilhamentos. E um abaixo-assinado ao Change.org convida a sociedade a se posicionar publicamente contra o retrocesso e a favor da proteção de crianças e adolescentes: Clique aqui para ver o abaixo-assinado.

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